quarta-feira, 7 de abril de 2010

A ciência do contraditório

Por Sérgio Montenegro Filho - repórter especial de Política do Jornal do Commércio, colunista do JC Online e blogueiro

Depois de 22 anos fazendo jornalismo, Mariana ainda me pede para escrever sobre o assunto. Quer que eu conte um episódio interessante que tenha visto ou vivido.Terrível ironia! Jornalista escrevendo sobre jornalismo, tendo a própria história como lide. Vai funcionar? Como jornalismo é a arte de encarar desafios, vamos a ele.
Antes, porém, já que falamos em desafios, um conselho grátis aos coleguinhas iniciantes: quem busca segurança e tranquilidade, e não está disposto a enfrentar desafios cotidianos, seria melhor dedicar-se a outra profissão, menos dada ao "inesperado".

Desafio, no jornalismo, significa esforço de sobrevivência. De fato, aquela ideia romântica do destemido repórter investigativo, cujos furos são aplaudidos pelos donos do jornal, elogiados pelos editores e lhe garantem incontáveis prêmios só existe no cinema. O que não quer dizer que não seja uma profissão apaixonante como poucas. Na verdade, vicia como droga na veia. Jornalismo é ame ou deixe, e no começo da carreira você já vai ter condições de fazer sua escolha.

Visto sob certo aspecto, o jornalismo é mágico. Ele torna humanos os de coração duro, ensina altruísmo aos egoístas e revela personalidades sensíveis em quem menos se espera. Assim como é capaz de corromper os de pouco caráter, expor os preguiçosos e expurgar os menos companheiros.

A magia, porém, é só um detalhe. O que pesa mesmo é a vida real. E nesta - que é chamada de "profissão do estresse" - não basta ao jornalista matar um leão por dia. É necessário dissecá-lo nos mínimos detalhes, examinar bem todos os ângulos e, com um pouquinho de sorte, encontrar uma boa história. Se conseguir fazer tudo antes de cair a noite, parabéns. Você pode se considerar um repórter.

Lembro de um "foca" que andou pela redação do JC. Vinha recomendado "de cima", caiu na editoria de Política e foi devidamente pautado. Estávamos às vésperas de uma nova campanha eleitoral, e o bravo aspirante teria que cobrir uma reunião de cúpula de determinado partido. Respirou fundo, pegou o bloquinho, saiu...  e sumiu!

Como na época ainda não dispunhamos das benesses do telefone celular - também chamado carinhosamente de "coleira" por alguns editores - findamos a edição sem a matéria, que foi publicada pelos concorrentes. E não é que no outro dia o cidadão reaparece? Na maior cara limpa, sorri, dá bom dia e, calmamente, senta-se para escrever. Questionado sobre não ter voltado à redação na noite anterior, o jovem periodista surpreendeu-se: "E era para escrever a matéria ontem mesmo, é?"

Pois bem. Além dos leões diários a serem mortos, vez por outra o jornalista esbarra em algumas dificuldades inerentes à profissão. Há a arrogância dos poderosos, a intolerância de chefes recalcados ou mesmo a imprecisão das fontes menos letradas. Tudo isso recompensado com uma remuneração mensal de fazer gosto! Mas e daí? Não éramos tão idealistas na faculdade?

Posso dizer, hoje, que sou um "homem de redação", apelido que se dá aos rinitentes, que conseguiram, sabe-se lá como, ficar expostos à alta pressão por mais tempo. Muitos desistiram, mas eu continuo por aqui. E agora, sem diploma, não é mesmo ministro?

Por fim, gostaria de afirmar que não duvido de quão árdua deve ser também a vida dos colegas assessores de imprensa, consultores de comunicação, acadêmicos. Enfim, gente que abraçou outras áreas dessa ciência tão complexa. A todos, parabéns pela data, da qual, confesso, eu nem lembrava. Boa sorte e sucesso. No mais, é continuar vivendo a contradição de uma rotina que todos os dias nos traz algo de novo.

2 comentários:

  1. Parabéns, Sérgio, pelo texto. Parabéns, Mariana, pela iniciativa com cara de homenagem. Valeu mesmo, e ...parabéns pra gente! ;*

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Olha o que os finos e fofos disseram